Friday, November 12, 2010

Latitude e morte

quando me refiro
a tantas coisas
inúteis
em um fluxo contínuo
de teorias obscuras
e desnecessárias
é que perdi meu caminho
é que perdi meu sentido
é que não sei mais
a distância
do queixo à ponta do meu nariz

(que sangra de forma tênue e serena
depois do soco que a vida me deu e
fez morrer em mim tanta coisa depois
da conversa de ontem que já não sei
mais se sou eu).

Necessário

preciso definir de 
forma imperativa
o senso inexpressivo
da angústia solitária.
preciso reparar
alguns danos
sócio-atemporais
e sanar pendências
amorais.
preciso incitar
minha poesia
ao escândalo
e regurgitar em versos
o obscuro e o amargo
da vida.
preciso recomeçar do zero
e me enganar de novo
e começar mais uma vez
e de novo não saber
porque insisto nisso.
preciso de um carro
novo
uma cara
nova
um motivo
novo
preciso do sol poente
ardendo em meus olhos
lacrimejantes
e
ao cair da tarde
preciso
recomeçar de novo
e me enganar de novo
e me amar também
porque preciso
porque persigo
porque é necessário.

Monday, September 06, 2010

Pedaços

espaços exíguos
pequenos
compactos
estanques - febris -
espaços ambíguos
de mim,
apartados de mim
-espaços sem fim.

(espasmos de vida
rascunhos de traços
construo a metrópole
dos meus sonhos
em pequenos pedaços
esparsos)
- pequenos pedaços -

(construo a mentira dos meus versos
na sinceridade da minha dor
- e só não finjo o amor que te sinto -
mas minto o tempo todo)

e minto aos pedaços
pequenos
espaços
vazios
de mim
que eu não sei
e nem quero mesmo
saber
porque minto tanto
e sinto tanto
e sinto muito
mais um dia
aos pedaços.

sinto o verso fracassado,
a rima ausente, a metáfora
insandecida,
o anagrama desfeito,
a poesia sem jeito,
feita aos poucos

de mim
de mais um dia
de nada que seja importante,
estilhaços de uma vida toda
lançados ao vento-pedaços.

Wednesday, August 18, 2010

Foda-se toda a poesia

foda-se a retórica empolada
-angustiante-
metafórica e hermética
da poesia.

quero palavras claras e simples
frases descomplexas,
-sem quaisquer rótulos inertes,
regras pré-fabricadas,
sem rumos nem sina.

frases singelas
como em uma canção de amor

e se o verso for imprescindível
que se elimine a rima óbvia
do amor que dói pois há mais
no amor que sangra
que apenas a dor de um poema,

há mais entre nós que o reflexo
do espelho da retina,

há mais nas palavras
que tento encontrar
e que me perco

que me faz optar
escolher revelar
regurgitar a poesia 
engolida em tantos anos 
passados a ferro
fogo fio e solidão

que só me resta gritar
que se foda toda poesia
mecânica
de tempos sincopados
de métricas sistemáticas

eu quero mais o que é seu
é meu
e nosso,
quero mais o que é fundo
distante
inseguro
quero mais um cigarro
um beijo
e que o amor sobreviva

quero mais o que for menos
porque mais é demais
e menos é a paz que eu preciso
e basta encostar no seu peito
e deixar a vida fluir
o tempo passar
e o verso sumir da poesia.

Wednesday, July 14, 2010

Para quem sente essa dor

dedicado a Guiomar


seus olhos estão pequenos
sua voz está pequena
seu corpo parece diminuir também
em você tudo me dá a impressão
de fim
e quero mesmo que acabe
essa dor que você sente
esse medo do porvir
essa angústia que você lastima
esse tanto de vida
esse tanto de vida que ainda há.

e que seus olhos se iluminem
da mais terna luz que se possa existir
que sua voz irrompa em trovões
guturais e ferozes
e que seus braços se fortaleçam
e arremessem seu corpo no espaço
e que sua vida se torne de novo
esse tanto de vida
esse tanto de vida que ainda há.

e que possamos lembrar disso tudo
com a serenidade de quem sabe
que esse tanto de vida ainda há.

Um som

como se fora possível
alterar o ritmo seguro
da rotina
e a mesmice inconsistente
das palavras que emprego
resolvi ousar e fiquei em silêncio...

no começo foram instantes
que viraram horas
que transbordaram em dias...

e assim me mantive

mudo...calado...
e pensei no silêncio
e calei também o pensamento
e olhei a janela
e silenciei a paisagem lá fora

e quando tudo parecia o que é
sem som de qualquer outra coisa
derramei uma lágrima
pequena
brilhante

que em queda me pareceu
um grande pedaço de mim

e ao encontrar o chão
preencheu o vazio do silêncio
como um grito
em meio ao vazio de tudo,
um som
em meio ao vazio de mim.

Saturday, April 24, 2010

Vida

meus dentes se cravam
em sua carne alva
que se inunda de sangue
que jorra incessante
que pulsa feroz
que é mais que poesia
é vida, é vida.

Vazio

obstáculo a frente
a fundo
a fenda
em meio a tudo
-interrompendo
a poesia
no fundo
um buraco
de qualquer tamanho.

Coisa

coisa
pouca
tola (a toa).

a vida navega
tormentas
escândalos
despedidas

coisa
tanta
tola (a toa).

Estar aqui

e se eu não estiver aqui
amanhã,
depois,
em algum momento
eu não estiver?
o que será das coisas,
da solidão dos sentidos,
dos edifícios
inacabados,
das palavras silenciadas,
dos tantos anagramas
desconstruídos?
o que será dos sons,
do medo (da morte),
da vontade de voar,
do olhar no vazio?
o que será da alegria
de estar aqui (com você) todo dia?
o que será de mim
quando eu não estiver aqui?
serei lembrança ou pergunta sem resposta?
esperança de volta ou um largo gesto de adeus?
saudades ou um poema esquecido
em meio a rotina incessante da vida?

Friday, April 02, 2010

Pieces of everything

o que fica daquilo que fomos?
quanto somos daquilo que fica?
há verdade nos resquicios de um sonho?
há mentiras nos recortes da vida?
o que sobra do quanto sonhamos?
o que sangra do quanto sabemos?

há verdades nos pedaços do mesmo
sonho que recorta a poesia
que ainda assim não entendemos.

Angústia

Abandonar as rimas lisérgicas de outrora
à própria sorte,
autônomas,
e deixar que fluam através do tempo
sem antes nem depois de nada.

De forma amena e singela
escrever uma carta ao passado
agradecendo as certezas de tantas dúvidas
projetadas no tempo que foi passando,
desavisado e simples, monótono e verdadeiro.

Recalcitrar determinações prévias
e mesmo alijado das rimas poetizar
o dia que amanhece em meus olhos
e cantar em versos os (tantos) segredos de ontem.

deixar escorrer pelo ralo da memória
a angústia do tempo que passa,
-estancar a verborragia inútil-
simplesmente olhar para trás
e fingir que não escuto
quando peço socorro.

Seguir meu caminho sem fim,
sem rumo,
sem nada.

Sunday, March 21, 2010

Vitimas Ocasionais

Há que se romper com as amarras do silêncio
e gritar de onde se estiver com pulmões plenos de liberdade e oxigênio,
do mais fundo que se possa.
Há que se mostrar o rosto, se expor, estar presente,
impor a própria presença e desafiar os presentes de forma objetiva, aguda, inconveniente
de modo a se manter vivo e atento.
Há que se morrer de amor para sobreviver-se à dor da solidão sem fim,
que se matar a cada fim de tarde para suportar o vazio da noite
que nunca se acaba.
É necessário fingir-se de presa frente ao predador
e enganar a si mesmo nas imagens refletidas,
há que se morder os lábios,
que se manter desperto, que se matar de novo
e sobreviver a tudo, a cada instante que se sucede ao outro.
É importante mencionar a vida, mascarar o medo,
respirar fundo e mergulhar atônito e descontrolado.
Há que se sorrir de novo
se em cada despedida houver um novo encontro,
Há que se gritar um verso e dançar sem jeito
posto que é necessário começar tudo de novo,
de um jeito novo - um novo jeito
que também se acabe
que também se mude,
mas que ninguém sabe e de forma aflita,
ardendo em febre e poesia,
se mostrar mais uma vez
e se entregar de novo.
A arte vitimiza a vida,
vilaniza o sonho,
elimina a dor.